agosto 25, 2010 por em Cliques, Privacidade

Quando a mercadoria é VOCÊ. Decisão no Caso Eduardo Jorge. Priv@cidade

O CONJUR publica matéria  – Eduardo Jorge terá acesso irrestrito à investigação – sobre a decisão judicial que concedeu o direito de acesso a todo e qualquer processo ou procedimento administrativo relacionados a quebra de seu sigilo fiscal.

A decisão do Magistrado Antonio Claudio Macedo da Silva – nesses tempos de apatia e perda da capacidade de irresignação – é uma peça alentadora do abrigo judicial da proteção dos sagrados direitos à intimidade e à privacidade.

Vale a leitura!

Seguem trechos esclarecedores:

. Que Estado é esse? Na era da tecnologia da informação o próprio Estado reconhece em duas notas públicas a excelência de seus sistemas de informações e admite que a quebra de sigilo ocorreu dentro do âmbito da própria Administração Pública (…)

. E os direitos fundamentais do cidadão à intimidade e à vida privada?

. Não se pode admitir um Estado Leviatã, no qual tudo que é sigiloso vaza para a imprensa (…)

. No caso em tela, o holocausto oferecido é a própria dignidade humana, que não pode sequer ter sua intimidade resguardada pelo Estado, o qual deve garantir a proteção aos dados relativos ao sigilo fiscal dos contribuintes.

. (…) Este não é o Brasil que foi desenhado na Carta de 1988, a qual substancia a certidão de nascimento de um Estado Democrático de Direito que garante a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental.

.Penso que o Brasil convive há muito tempo com janelas quebradas na vizinhança da proteção ao sigilo, havendo uma relação promíscua entre alguns setores da Administração Pública e alguns setores da imprensa, na qual se veiculam informações protegidas por sigilo legal sem que se saiba a autoria da quebra nem tampouco haja indignação da sociedade como um todo, a qual parece conviver com tranqüilidade com esse fenômeno.

Íntegra da decisão judicial publicada no CONJUR

Esse antigo artigo continua atual: Inform@ção e Priv@cidade

http://www.nucleodedireito.com/sem-categoria/informacao-e-privcidade/

A responsabilidade legal pelo vazamento do Enem. Base de dados sob a guarda do Governo Federal

A violação e compartilhamento indevidos das informações constantes das bases de dados sob controle do Poder Executivo Federal, tem se tornado uma preocupação constante no que se refere à responsabilidade estatal pela guarda das informações que lhe são confiadas.

O anunciado vazamento de dados pessoais identificáveis dos inscritos no ENEM expõe a fragilidade da Política de Informação implantada na esfera pública e demonstra que o modelo de segurança adotado pelo Governo não alcança um adequado nível de proteção de dados.

A Política de Segurança da Informação nos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, instituída pelo Decreto 3.505/2000, tem por objetivo assegurar a garantia ao direito individual e coletivo das pessoas, a confidencialidade e a devida proteção da informação sob sua guarda, de assuntos de interesse do cidadão e à inviolabilidade da sua intimidade e privacidade. Tem como pressupostos básicos assegurar a proteção de assuntos que mereçam tratamento especial, destacando a importância das informações processadas e sobre o risco da sua vulnerabilidade.

A Política de Segurança da Informação é atribuição da Secretaria-Executiva do Conselho de Defesa Nacional, órgão vinculado ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, e recebe assessoramento do Comitê Gestor da Segurança da Informação e conta com apoio técnico e operacional da Câmara Técnica de Segurança da Tecnologia da Informação.
Por outro lado, a Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação (SLTI) – vinculada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – exerce importante papel na implementação da PSIPE, uma vez que detém a competência de coordenar as atividades do Sistema de Administração de Recursos de Informação e Informática, no âmbito da Administração Pública Federal.

Como admitido pela SLTI, as ameaças à segurança da informação se localizam nas vulnerabilidades existentes nos ambientes onde a informação é processada, armazenada ou transmitida e as ameaças externas e internas à segurança da informação.

Infelizmente, o Brasil não dispõe de legislação no que tange a responsabilização legal pelo tratamento da informação e o direito de reparação por eventual prejuízo sofrido. A União Européia editou Diretivas que cuidam especificamente da proteção liberdades e direitos fundamentais das pessoas singulares e do tratamento dispensado aos dados pessoais e proteção da privacidade no setor das comunicações eletrônicas, prevendo a responsabilização pelo responsável pelo tratamento da informação e o direito de reparação pelo prejuízo sofrido.

Tais episódios de violação de garantias individuais são intoleráveis, cabendo ao cidadão atingido buscar a defesa de seu direito de controle da circulação de seus dados pessoais, assim como a responsabilização legal do detentor da guarda de seus registros.

O titular dos dados de sua identidade em meio digital deve procurar a proteção de sua esfera íntima, exercitando seu direito de defesa contra eventual uso indevido de seus registros pessoais.

A pessoa lesada deve buscar a confirmação do compartilhamento público de suas informações pessoais junto ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INPE), na qualidade de detentor das informações da base de dados violada.

Em ocorrendo omissão ou resistência do órgão em fornecer a informação solicitada, pode-se buscar abrigo no remédio constitucional do habeas data que assegura o conhecimento de informações relativas à sua pessoa, constantes de bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público.

O exercício do direito de controle das informações pessoais constantes em sistemas informatizados é um direito constitucional de caráter personalíssimo que necessita ser exercido, sob pena de se instalar um autoritarismo digital.

Ana Amelia Menna Barreto

Presidente da Comissão de Direito e Tecnologia da Informação da OAB/RJ

 

Direitos Fundamentais em Rota de Colisão

O Caso do Supremo
O grande interesse pelo julgamento do caso mensalão foi ofuscado pela veiculação de imagens fotográficas de telas de computadores que apresentaram a íntegra de diálogos mantidos por Ministros do STF. O fato revela contornos inusitados, gera polêmica e inspira reflexão.

Observado o princípio da publicidade, os julgamentos do plenário da Corte são transmitidos em rede nacional de TV fechada, permitido o livre acesso de jornalistas e fotógrafos.

Figuram na categoria de direitos fundamentais protegidos constitucionalmente a liberdade de informação e o direito de expressão, sendo vedada qualquer restrição a livre manifestação do pensamento, expressão e informação. A informação pública de fatos, não se sujeita a nenhum dispositivo legal que constitua embaraço à plena liberdade de informação jornalística, em qualquer veículo de comunicação social, desde que observados o elenco restante de direitos inscritos na mesma esfera.

Sob esse prisma, tratando-se de imagens capturadas em ambiente público pode-se considerar lícita a referida publicação, uma vez que a tela do equipamento integrava esse ambiente, encontrava-se disponível à visão pública.

Igualmente habita o universo de proteção constitucional absoluta a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e imagem das pessoas. Desde que cumpridos os requisitos legais impostos, admite-se a possibilidade de interceptação do sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, que se sujeitam à prévia e expressa autorização judicial.

Ocorre que o fato caracterizador da violação de garantias individuais cinge-se exclusivamente ao conteúdo da publicação, fato de denota a ausência de questionamentos da fotografia do equipamento que apresentava sites noticiosos.

O diálogo eletrônico não se efetivou por servidor internet de e-mail, mas sim através de servidor de correio intranet. Trata-se de um meio de comunicação interno, disponível exclusivamente a usuários autorizados. As mensagens trafegam dentro da rede privativa, em ambiente que garante o isolamento do tráfego da informação entre os partícipes da relação comunicacional.

Portanto, publicou-se imagem capturada dos equipamentos operados pelas únicas partes integrantes do diálogo – emissor e receptor – revelando o conteúdo de uma comunicação de natureza privada, contendo informações e opiniões de cunho pessoal.

Nesse caso, pode-se conceber a ocorrência de violação do direito à privacidade, ou, a figura de violação de comunicação privada por câmara fotográfica.

A questão revela aspectos de interpretação complexa: confronto entre direitos constitucionalmente protegidos, questionamento quanto à delimitação e abrangência de cada qual, indagação sobre a prevalência de prerrogativas e a necessidade de convivência harmônica.

Por fim, os flashes se direcionam a investigação do conceito de privacidade frente aos meios eletrônicos. A pauta está aberta …

2007
Jornal Hoje em Dia

Informação e Priv@cidade

O largo crescimento do uso dos meios eletrônicos acelerou o processo de desenvolvimento da Internet, que agora vivencia sua fase adolescente da segunda geração, apesar de ainda não compreendido integralmente o mundo eletrônico.

A inicial zona de dados desorganizada adquiriu nova arquitetura dotada de tecnologia inteligente de coleta e processamento de dados em sistemas interconectados, com programas que compartilham informações e inserem espécies de anzóis para pescar dados dos usuários.

A recém criada sociedade que se aconchega no berço da rede pública mundial de computadores, tem como principal alimento a informação. O mercado em franca expansão negocia informações pessoais identificáveis, consideradas blue chips eletrônicas.

Podemos imaginar a Internet como um enorme mercado persa, aberto e ao ar livre, onde a mercadoria oferecida é você: seus hábitos de consumo, navegação e preferências.

A nova geração interconectada interage na vida eletrônica fornecendo seus dados pessoais nas mais variadas formas. Disponibiliza o nome, endereço eletrônico, número de telefone e cartão de crédito em cada visita a uma página eletrônica. Torna, assim, pública a vida particular.

Em nosso ordenamento jurídico o direito à intimidade e à vida privada está protegido constitucionalmente, mas, certamente, privacidade e segurança não encontram ambiente seguro na tecnologia. Porém, o ponto central reside na forma como são obtidos, utilizados, gerenciados e controlados os dados pessoais nessa coleta seletiva de informação.

As empresas da nova economia descobriram um nicho de mercado que segue atachado a sua atividade fim, comprando e vendendo DNA eletrônico dos usuários. Essa criativa fonte de receita concebida como serviço de valor agregado ao produto, na verdade comercializa o conhecimento dos hábitos pessoais de seus assinantes e pode ser interpretada como sinônimo de invasão de privacidade.

O endereço eletrônico espontaneamente fornecido a uma determinada página, termina por ser negociado a empresas cuja única atividade reside em comercializar listagens. A versão digital da clássica mala direta, conhecida como spam, além de molestar causa ainda enormes prejuízos, tendo em vista que o custo da conexão é suportado pelo consumidor final.

O promissor mercado que vem se consolidando através do meio eletrônico, antes mesmo do amadurecimento do comércio desenvolvido através de dispositivos fixos, se depara com os novos horizontes proporcionados pelo comércio móvel, sem se comentar o futuro início de operação da TV digital no País.

Essa nova modalidade de mercancia encontra outras aplicações e utilidades, passando a contar com poderosas ferramentas de identificação do perfil eletrônico do usuário, onde o direito de ser deixado em paz pode parecer estar definitivamente sepultado.

O serviço de telecomunicação móvel dispõe de funções mais criativas que operam no conceito de ofertar qualquer coisa, a qualquer pessoa, a qualquer hora, em qualquer lugar e durante a locomoção.

As próximas redes que entrarão em funcionamento, utilizam tecnologia de alta precisão que permite a localização dos assinantes. Por um lado, passarão os usuários a receber o disparo certeiro de anunciantes de telemarketing. O conhecimento da posição geográfica pode ensejar a ligação publicitária de comerciantes localizados na área onde se encontra o assinante. Está, portanto, lançada a modalidade spam sem fio, onde ao invés de receber uma mensagem silenciosa, será o aparelho celular que emitirá sinal sonoro ao recebimento de cada indesejada chamada. Por outro lado, se bem empregada, a tecnologia poderá possibilitar o socorro em situações de emergência, bem como precisar a localização em caso de desaparecimento.

Algumas iniciativas regulatórias prevêem a necessidade do prévio e expresso consentimento do usuário para que sua localização possa ser divulgada, restando ainda ser desenvolvida a implantação de mecanismos capazes de garantir a privacidade do assinante que não deseja receber mensagens comerciais.

Sabe-se que os usuários da terceira geração de telefonia móvel em funcionamento no Japão, estão insatisfeitos com a grande quantidade de mensagens não solicitadas recebidas em seus aparelhos. A alternativa inicialmente apontada não foi considerada suficiente pelo Governo, pelo que a operadora se viu forçada a desenvolver solução tecnológica que possibilite a filtragem de endereços, além de oferecer redução do custo da tarifa como uma tentativa de minimizar o descontentamento de seus assinantes.

Sob outro prisma, os Estados Unidos, costumeiramente ferrenhos defensores da liberdade, estão vivenciando um processo de revisão de seus conceitos primordiais, após o atentado terrorista a que foram vítimas. O programa do FBI de monitoramento de correio eletrônico, que encontrou forte resistência de grupos defensores da proteção de dados pessoais na web, volta a ser analisado sob um novo conceito de confidencialidade das comunicações. Instaurado o temor coletivo, foi aprovado pela Câmara dos Deputados, projeto de lei que garante ao governo americano a possibilidade de monitorar comunicações de dados e de voz.

Ressalte-se que a questão crucial reside na forma de utilização da tecnologia. Em ambiente de consumidores cada vez mais esclarecidos, as empresas envolvidas no mercado digital devem estar atentas à questão da privacidade pessoal. A correta avaliação da eficácia da propaganda, bem como a divulgação das práticas de manipulação de dados, podem se transformar em um diferencial e se traduzir em vantagem competitiva.

Deve-se enfrentar a necessidade de revisão da idéia de proteção em um ambiente em que a auto-regulamentação pode surtir melhores e mais eficazes efeitos, se traduzindo, na prática, em adesão compulsória aos princípios da ética e transparência.

Assim, a solução seria encontrada no próprio mercado, uma vez que previsível a migração dos usuários a outras empresas que pautam sua atuação baseada nos conceitos de responsabilidade, confiança e respeito ao consumidor.

De qualquer forma, é imprescindível a adequação do ordenamento jurídico à plataforma eletrônica, direcionando sua atenção ao respeito à privacidade individual, sem promover uma avalanche regulatória que possa impedir o desenvolvimento tecnológico.

2005
Jornal Gazeta Mercantil